Geralmente são versos picantes, desaforados. O chiste e a ironia mais das vezes como desnudantes da hipocrisia e do preconceito. Raro o poeta que não se tenha utilizado da pilhéria e do gracejo. No Papeando 77 tivemos uma amostra da espécie, no Soneto Futurista, de Carlos de Laet. Hoje apresentamos Argumento de Defesa, de Bastos Tigre (1882-1957). Por oportuno, de acrescentar que Bastos Tigre nasceu em Recife-PE. Jornalista, poeta, compositor, teatrólogo, humorista e publicitário. É dele o slogan da Bayer que correu mundo: “Se é Bayer é bom”. O Dia do Bibliotecário foi instituído em sua homenagem, vez que é considerado como o primeiro bibliotecário, por concurso (1915 - Museu Nacional), do Brasil.
ARGUMENTO DE DEFESA
Bastos Tigre
Disse alguém, por maldade ou por intriga,
Que eu de Vossa Excelência mal dissera:
Que tinha amantes, que era “fácil”, que era
Da virtude doméstica, inimiga.
Maldito seja o cérebro que gera
Infâmias tais que, em cólera, maldigo!
Se eu disse tal, que tenha por castigo
O beijo de uma sogra ou de outra fera!
Ponho a mão espalmada na consciência
E ela, senhora, impávida, protesta
Contra essa intriga da maledicência!
Indague a amigos meus: qualquer atesta
Que eu acho e sempre achei Vossa Excelência
Feia demais para não ser honesta...
Alfim, vai um soneto meu. Nunca neguei que tenho queda pelas zanolhas, que o estrabismo é um velho recurso de sedução, discretamente utilizado por Vênus.
DOCE ZANOLHA
Valdez
Passaram tantas, frente à minha porta:
Louras, morenas, gordas, magricelas...
Lindas mulheres! Outras... não tão belas,
Mas todas fêmeas, saias, é o que importa.
Tantas Marias... Santas, pecadoras...
Ah! que saudades da Zanolha tenho!
Seu gosto doce como mel de engenho;
Feia, baixinha, formas sedutoras.
Um sol denso, fugaz, uma aquarela
Que compus na memória, sobre tela.
São lembranças. Difícil esquecê-las:
A zanolha gemendo seus abrolhos...
Um dos olhos postado nos meus olhos,
E o outro vagueando nas estrelas...